Novela de Marcus Vinick
Escrita com
Miguel Rodrigues
Direção
Miguel Rodrigues
Direção Geral
Miguel Rodrigues
Núcleo
#DNA – Dramaturgia Novos Autores
Personagens deste capítulo
ÂNGELO
MARCELO
GABRIELA
SOPHIA
MIGUEL
EVANDRO
CAROLINA
Participação Especial
-
CENA 01.
IMAGENS AÉREAS DA CIDADE DE CAMPO BONITO – PARANÁ. EXTERNA.DIA.
SUCESSÃO DE IMAGENS MOSTRANDO AS BELEZAS
DA CIDADE DE CAMPO BONITO, NO PARANÁ. VEMOS O MOVIMENTO DA CIDADE.
INSERIR
LEGENDA:
CAMPO BONITO, PARANÁ – 1979
CONTINUAMOS MOSTRANDO A CIDADE ATÉ
CHEGARMOS EM UMA ESTRADA DE BARRO. AO LONGE VEMOS UM CARRO OPALA, EM MOVIMENTO,
ATÉ CHEGARMOS A UMA ENORME FAZENDA.
CORTA IMEDIATO PARA:
CENA 02.
FAZENDA DE ÂNGELO. CAMPO BONITO. EXTERNA. DIA.
O OPALA ATRAVESSA A PORTEIRA DA FAZENDA DE
ÂNGELO E PÁRA EM FRENTE À CASA GRANDE, ONDE VEMOS ÂNGELO O VELHO FAZENDEIRO EM
PÉ OBSERVANDO A CHEGADA DOS FAMILIARES. SOPHIA, UMA MENINA DE MAIS OU MENOS
OITO ANOS DE IDADE, SALTA DO OPALA E CORRE EM DIREÇÃO AO AVÔ E O ABRAÇA. ÂNGELO
SORRI E CORRESPONDE AO ABRAÇO DA NETA.
ÂNGELO - (COLOCANDO SOPHIA NOS BRAÇOS) Ô,
minha neta!
SOPHIA - Não via a hora de chegar aqui.
ÂNGELO - Eu também não via a hora de
revê-los. Para onde vocês foram mesmo?
SOPHIA - Fomos para Paris... É lindo
lá!
MARCELO E GABRIELA APROXIMAM-SE. ÂNGELO
PÕE A NETA NO CHÃO E VAI AO ENCONTRO DO FILHO E DA NORA.
ÂNGELO - (ABRAÇA O MARCELO) Filho!
ÂNGELO SE AFASTA DE MARCELO E VAI
CUMPRIMENTAR GABRIELA. MARCELO CONTINUA O DIÁLOGO COM ÂNGELO.
MARCELO - Espero que o senhor não tenha se
sentido solitário essas três semanas, afinal sempre viemos aqui todos os fins
de semana.
ÂNGELO - Vocês têm que aproveitar a vida
de vocês, não podem ficar visitando esse velho a todo o momento.
GABRIELA - Não diga isso, Seu Ângelo... Nós
adoramos vir aqui nos finais de semana.
ÂNGELO - (INSISTE) Mas vocês têm a vida
de vocês.
MARCELO - A Sophia adora passar os finais de
semana aqui, pai... Não iremos privá-la disso.
SOPHIA - (INTERFERE) E o Miguel?
GABRIELA - (OLHA SERIAMENTE PARA SOPHIA) Você
já vai procurar aquele menino, Sophia?
ÂNGELO - (INTERFERE) Deixe, Gabriela... A
Sophia e o Miguel se dão muito bem.
GABRIELA FICA INCONFORMADA, MAS NÃO
DEMONSTRA INSATISFAÇÃO.
SOPHIA - Onde está o Miguel, vovô?
ÂNGELO - Ele está no celeiro.
SOPHIA CORRE ATÉ O CELEIRO. GABRIELA
DISFARÇADAMENTE FIXA A FILHA COM AR REPROVATIVO.
GABRIELA - (GRITA) Tome cuidado com os cavalos.
ÂNGELO - Os cavalos são dóceis, Gabriela.
GABRIELA OLHA PARA O SOGRO E EM SEGUIDA
DESVIA O OLHAR DISFARÇADAMENTE. MARCELO PERCEBE O CLIMA E DÁ UM JEITO DE
QUEBRÁ-LO.
MARCELO - (SORRI) Vamos entrar?
ÂNGELO - Vamos, meu filho!
OS TRÊS ENTRAM NA CASA GRANDE.
CENA 03.
FAZENDA DE ÂNGELO. CELEIRO. INTERNA. DIA.
SOPHIA CHEGA AO CELEIRO E DIRIGE-SE À
MIGUEL, QUE PERCEBE OS PASSOS E EM SEGUIDA A OLHA COM UM SORRISO NO ROSTO.
MIGUEL - Sophia!
SOPHIA - (SORRINDO) Miguel!
MIGUEL - (LEVANTA-SE E A ABRAÇA) Eu já
estava com saudades de você!
SOPHIA - (CORRESPONDE) Eu também.
MIGUEL - E como foi a sua viagem?
SOPHIA - Foi inesquecível... Paris é
uma cidade encantadora!
MIGUEL AFASTA-SE DE SOPHIA, FAZ UMA
EXPRESSÃO TRISTE E A MENINA PERCEBE.
SOPHIA - O que foi, Miguel?
MIGUEL - (MENTE) Nada.
SOPHIA - Ninguém fica triste por
nada... Se você não me disser, eu vou ficar brava.
MIGUEL - É que você deve ter conhecido
meninos legais por lá... Meninos ricos, que se vestem bem e falam palavras
difíceis.
SOPHIA - Palavras difíceis eles falam,
porque são franceses... (rindo) E eu não entendo francês!
MIGUEL DÁ UM SORRISO E A MENINA SE
APROXIMA DELE.
SOPHIA - Nenhum menino te substituirá,
porque você é meu amigo e os amigos são insubstituíveis.
MIGUEL - Você tem dinheiro!
SOPHIA - (CORRIGE) Os meus pais têm dinheiro.
MIGUEL - E você continua rica.
SOPHIA - (PARECENDO INDIGNADA) Queria
que eu fosse pobre?
MIGUEL - (DANDO RAÇÃO ÀS GALINHAS) Se
você fosse pobre, nossa amizade iria durar para sempre.
SOPHIA - (UM POUCO IRRITADA) Nossa
amizade irá durar para sempre... É só você querer.
MIGUEL - É só você querer, Sophia.
SOPHIA - Vocês homens, acham que tudo
depende nós, mulheres. (MIGUEL SOLTA UMA RISADA) Do que está rindo, Miguel?
MIGUEL - Você é apenas uma molequinha
que a recém saiu das fraldas e já está falando como se fosse uma mulher adulta.
SOPHIA - E você não passa de um
pivete... Quer saber, Miguel?... Os meninos de Paris dão de dez em cima de
você.
MIGUEL - (REVOLTADO JOGA RAÇÃO NO
VESTIDO DE SOPHIA) E porque você não volta pra essa tal de Paris?
SOPHIA - Você sujou meu vestido com
essa ração, seu pivete!
MIGUEL - (IRONICAMENTE) Vai dizer que
comprou esse vestidinho em Paris?
SOPHIA - (GRITA) Comprei! (t) E é
tecido fino viu, ao contrário desses trapos que você veste e chama de roupa!
MIGUEL OLHA PARA SOPHIA E LOGO ENCHE OS
OLHOS D’ÁGUA. SOPHIA PERCEBE QUE O OFENDEU E TOCA EM SEU ROSTO.
MIGUEL - (AFASTA-SE) Não me toque!
SOPHIA - Miguel, eu não queria falar
dessa forma com você...
MIGUEL - (JÁ NÃO CONTENDO AS LÁGRIMAS) O
meu tio tem razão quando diz que vocês ricos só sabem pisar em cima de nós, que
somos humildes.
MIGUEL ESCONDE-SE EM UM CANTO. SOPHIA FICA
DESOLADA E NÃO SABE O QUE FAZER. APROXIMA-SE DE MIGUEL.
SOPHIA - Miguel, eu... Eu amo você.
MIGUEL - Quem ama não machuca!
SOPHIA - Miguel, eu te amo como se você
fosse meu irmão. Não temos idade para saber o que é o amor de verdade, mas é
isso que eu sinto por você. (MIGUEL SAI DO CANTO E FICA OLHANDO SOPHIA) Você é
dois anos mais velho do que eu, mas você consegue ser mais infantil.
MIGUEL - Continuo sendo o mais velho e
me orgulho.
SOPHIA - Você pode até ser mais velho,
mas eu sou mais inteligente.
MIGUEL - Não quero brigar de novo,
Sophia.
SOPHIA - Eu também não quero mais
brigar com você, Miguel.
MIGUEL - (ESTENDE A MÃO PARA SOPHIA)
Amigos novamente?
SOPHIA - Nós nunca deixamos de ser
amigos, seu bobo.
MIGUEL - E nem eu quero que aconteça.
SOPHIA - (SORRI) Nossa amizade irá
durar para a eternidade.
MIGUEL DÁ UM SORRISO E ESTENDE SUA MÃO
NOVAMENTE. A MENINA, POR SUA VEZ, PEGA A MÃO DELE E FICA O OLHANDO FIXAMENTE.
CORTA PARA:
CENA 04.
FAZENDA DE ÂNGELO. SALA DA CASA GRANDE. INTERIOR. DIA.
GABRIELA PASSA PELA SALA PRÓXIMO À
ESCADARIA E PERCEBE QUE O MARIDO E O SOGRO CONVERSAM NA BIBLIOTECA DA CASA
GRANDE. ELA APROXIMA-SE UM POUCO DA PORTA E OBSERVA TUDO DO LADO DE FORA.
CORTA IMEDIATO PARA:
CENA 05.
FAZENDA DE ÂNGELO. BIBLIOTECA. INTERIOR. DIA.
MARCELO E ÂNGELO ESTÃO SÉRIOS. CONVERSAM.
MARCELO PARECE TRISTE. GABRIELA OBSERVA TUDO DO LADO DE FORA. PODEMOS
PERCEBÊ-LA POR ENTRE UMA FRESTA QUE APARECE POR CONSEQUÊNCIA DE A PORTA ESTÁ
ENTRE-ABERTA.
ÂNGELO - Pelo que você está me dizendo,
essa viagem à Paris deu um enorme gasto.
MARCELO - Nós só fizemos essa viagem porque
eu queria proporcionar esse presente para Sophia. Ela nunca tinha viajado de
avião e nunca tinha conhecido a Europa.
ÂNGELO - Tudo bem, meu filho, mas você
não está em uma boa situação financeira. Logo, logo você acabar perdendo tudo.
O que será de sua família? Não se esqueça que eu não sou eterno e que essa
fazenda não irá fazer com que você recupere seu patrimônio perdido. A sua
esposa já sabe dessa situação?
MARCELO - (TRISTE) Não. Eu ainda não falei
nada para Gabriela. E se eu falar, ela irá querer se separar de mim. Eu não
quero perdê-la de jeito nenhum.
ÂNGELO - Se ela te ama de verdade, ela
irá ficar ao seu lado.
MARCELO - A Gabriela me ama, só não iria
querer viver em uma condição a que ela não está acostumada.
ÂNGELO - (SÉRIO) E você chama isso de
amor?
MARCELO - Por que o senhor sempre duvidou do
amor que a Gabriela sente por mim?
ÂNGELO - Porque sua esposa nunca me
passou confiança alguma.
MARCELO - O senhor não a conhece direito.
ÂNGELO - E você também não a conhece
direito, já que pensa que pela sua futura falência, ela pode vir a se separar
de você, mas mesmo assim, você pensa que ela te ama.
MARCELO FICOU QUIETO POR ALGUNS INSTANTES,
BALANÇOU A CABEÇA NEGATIVAMENTE.
MARCELO - Eu estou me sentindo confuso, pai.
Eu temo ir à falência, perder minha casa, perder o conforto que posso dar pra
minha menina e pra minha esposa. Eu estou me sentindo tão mal com tudo isso.
ÂNGELO - Você é quem quis seguir o ramo
dos negócios empresariais na cidade. Eu te avisei pra ficar aqui, progredir
plantando, cuidando dos bichos...
MARCELO - (UM POUCO IRRITADO) Pai estava tudo
dando certo até agora. Eu não estou “quebrado” há muito tempo.
ÂNGELO - Você tem que conversar com sua
esposa, é isso que você tem que fazer agora.
MARCELO - Eu vou arranjar forças primeiro.
ÂNGELO - Até a Sophia, que é uma criança,
é mais forte do que você.
MARCELO - Não me ponha para baixo, por
favor?!
ÂNGELO - Estou sendo realista, meu filho!
MARCELO - (IRRITADO) Seja menos realista e me
dê mais apoio.
CORTA PARA:
CENA 06.
CAMPO BONITO. FAZENDA DE ÂNGELO. STOCK SHOTS.
MOSTRAMOS IMAGENS DE CAMPO BONITO,
EXATAMENTE DA FAZENDA DE ÂNGELO. VEMOS UMA SUCESSÃO DE IMAGENS INDICANDO
PASSAGEM DE TEMPO. VEMOS OS EMPREGADOS DE ÂNGELO EM VÁRIAS ATIVIDADES DA
FAZENDA E EM SEGUIDA PERCORREMOS TODA FAZENDA ATÉ CHEGARMOS A UM GRAMADO
PRÓXIMO.
CORTA IMEDIATO PARA:
CENA 07.
FAZENDA DE ÂNGELO. GRAMADO. EXTERNA. FINAL DE TARDE.
VEMOS MIGUEL E SOPHIA DEITADOS NO GRAMADO.
CONTEMPLAM UM DOS ESPETÁCULOS MAIS LINDOS DA NATUREZA: O PÔR-DO-SOL.
SOPHIA - É lindo!
MIGUEL - É mágico! (ELE PEGA NA MÃO DE
SOPHIA, ELA OLHA PARA O MENINO E APERTA A MÃO DELE) Sophia, você promete que
iremos ficar juntos pra sempre?
SOPHIA - Juntos pra sempre?
MIGUEL - Pra sempre.
SOPHIA - Eu juro... E você, Miguel?
MIGUEL - (A OLHA COM AFETO) Eu também
juro.
OS DOIS FICAM SE OLHANDO POR ALGUNS
SEGUNDOS. VALORIZAR O MOMENTO DOS DOIS. VAMOS NOS AFASTANDO E AGORA
CONTEMPLAMOS TAMBÉM O PÔR-DO-SOL POR ALGUNS SEGUNDOS.
CORTA PARA:
CENA 08.
FAZENDA DE ÂNGELO. CASA GRANDE. QUARTO DE SOPHIA. INTERNA. FINAL DE TARDE.
SOPHIA ENTRA NO QUARTO E SE DEPARA COM A
MÃE, GABRIELA. NOTAMOS CERTA SERIEDADE NA MULHER.
GABRIELA - (CHAMA A ATENÇÃO DA FILHA) Você está
imunda!
SOPHIA - Como a senhora queria que eu
estivesse, mãe? Eu estava brincando com o Miguel.
GABRIELA - Com aquele menino? Quantas vezes eu
vou ter que lhe avisar que aquele menino não é uma boa influência para você?
SOPHIA - Ninguém influencia ninguém...
O Miguel é meu amigo.
GABRIELA - E você ainda tem a resposta na ponta
da língua.
SOPHIA - É pra senhora ver que eu não
sou uma menina ingênua de oito anos. A senhora diz que o Miguel é uma má
influência porque ele não faz parte da mesma condição social que a nossa, mas a
senhora está sendo preconceituosa.
GABRIELA - (GRITA) Cale a boca! (t) Eu sei o
que é bom pra você!
SOPHIA - Se você soubesse, não tentaria
me afastar do único amigo que eu tenho.
GABRIELA PERDE A PACIÊNCIA E DÁ UMA BOFETADA NA CARA
DE SOPHIA. A MENINA NÃO CONTÉM AS LÁGRIMAS.
GABRIELA - Você é apenas uma menina e não sabe
nada da vida. Aquele garoto não passa de um pobre coitado. Um interesseiro. Ele
sabe que você é rica e pode muito bem se aproveitar disso para te furtar, pra tentar
pegar algo de valioso que você tenha, como uma pulseira, uma corrente...
SOPHIA - (CHORANDO) O Miguel não é um
ladrão.
GABRIELA - Não se esqueça que ele é mais velho
que você, Sophia... Ele é esperto.
SOPHIA - O Miguel é um bom menino.
GABRIELA
DÁ UMA RISADA IRÔNICA, DÁ ALGUNS PASSOS SE AFASTANDO E DEPOIS SE VIRA PARA SUA
FILHA.
GABRIELA - A vida vai te mostrar quem é quem.
Com o tempo, você irá ver que aquele garoto não vale nada. Você irá cair em uma
desilusão tão grande quando isso acontecer, que acabará me dando razão de todas
as coisas que eu estou lhe dizendo agora. Você irá ver que eu sempre estive
certa.
SOPHIA - (ENCARA A MÃE) O Miguel é meu
amigo! Ele é tudo pra mim.
GABRIELA - Você é apenas uma garotinha de oito
anos e mimada, não tem noção das besteiras que fala.
SOPHIA SE RETIRA DO QUARTO, REVOLTADA.
GABRIELA FICA UM POUCO PENSATIVA POR ALGUNS INSTANTES, CAMINHA DE UM LADO PARA
OUTRO.
GABRIELA - Eu vou ter que dar um jeito de
acabar com essa amizade. Eu vou tirar esse garoto imundo da vida de minha
filha.
GABRIELA OLHA FIXAMENTE PARA UM MÓVEL.
VALORIZAMOS O OLHAR AMEAÇADOR DE GABRIELA.
CORTA PARA:
1º INTERVALO
PARA COMERCIAIS
CENA 09.
CAMPO BONITO. FAZENDA DE ÂNGELO. CASA DE MIGUEL. NOITE.
MIGUEL ESTÁ NA VARANDA DE SUA CASA.
OBSERVA O CÉU QUE ESTAVA RADIANTE PELO BRILHO DAS ESTRELAS NAQUELA NOITE.
CAROLINA APROXIMA-SE DO FILHO. COLOCA A MÃO EM SEU OMBRO. MIGUEL OLHA PRA MÃE.
CAROLINA - Vamos jantar, filho?
MIGUEL - Já vou, minha mãe... Só vou
ficar olhando mais um pouco as estrelas.
CAROLINA - (OLHA PARA O CÉU E SORRI) O céu está
lindo!
MIGUEL - (SORRI) As estrelas me lembram
os olhos da Sophia.
CAROLINA - Eu sabia que você estava pensando
nela... Filho, eu já lhe avisei sobre sua amizade com Sophia.
EVANDRO - (INTERFERE) Eu também não gosto
nada dessa amizade.
MIGUEL - (SE AFASTA) Eu gosto muito da
Sophia.
EVANDRO - Ela é neta do patrão, filha do
Doutor Marcelo, que é um homem rico. E você, meu filho? Você é apenas o filho
dos criados da fazenda.
MIGUEL - Minha amizade com Sophia é
maior do que isso, pai.
EVANDRO - É aí que você se engana, meu filho.
Vocês são apenas duas crianças. A Sophia só tem oito anos de idade, mas não te
dou nem mais três anos pra ela te esquecer de vez. (MIGUEL FICA BRAVO EM UM CANTO
E PREFERE FICAR QUIETO. EVANDRO CONTINA) Filho, só estou te avisando pro teu
bem.
CAROLINA - O seu pai tem razão, meu anjo.
EVANDRO - (DIRIGE-SE AO FILHO) E eu já
percebi que a Dona Gabriela não gosta nem um pouco de você.
MIGUEL CONTINUA
QUIETO E EMBURRADO.
CORTA PARA:
CENA 10. FAZENDA DE ÂNGELO. CASA GRANDE. SALA DE
JANTAR. INTERNA. NOITE.
NA CASA GRANDE O
JANTAR JÁ HAVIA SIDO SERVIDO. ÂNGELO DÁ POR FALTA DA NETA, SOPHIA.
ÂNGELO - A Sophia não vem jantar conosco?
MARCELO - A Sophia está emburrada, no quarto.
ÂNGELO - Por quê?
GABRIELA - A Sophia a recém é uma criança de
oito anos e já fica brava por qualquer coisinha. Não se pode falar nada que ela
já fica assim.
ÂNGELO - Eu conheço a minha neta.
GABRIELA - (FULMINA O SOGRO COM O OLHAR) E eu
conheço a minha filha.
ÂNGELO - Não parece.
GABRIELA - Como assim? Como eu não conheço a
minha própria filha? Eu sou mãe em primeiro lugar.
ÂNGELO - (LEVANTA-SE) A Sophia não fica
emburrada por qualquer motivo. Algo muito sério aconteceu e eu vou ver isso
agora.
MARCELO - (TENTA INTERFERIR) Pai, jante em
paz. Não se preocupe com a Sophia.
ÂNGELO - Eu vou ver o que a minha neta
tem. Com licença!
ÂNGELO RETIRA-SE
EM DIREÇÃO AO QUARTO DA NETA. GABRIELA E MARCELO OBSERVAM ÂNGELO, QUE SE
AFASTA. GABRIELA OLHA SERIAMENTE PARA O MARIDO.
GABRIELA - A Sophia está se tornando uma garota
mimada porque o seu pai vive para os caprichos dela. Se ela está desse jeito, a
culpa é dele!
MARCELO - Meu pai ama muito a nossa filha. É
normal que ele queira a proteger sempre passando a mão na cabeça dela.
GABRIELA - (IRRITADA) E aí a educação que nós
damos a ela acaba perdendo a credibilidade.
MARCELO REVIRA OS
OLHOS, RESPIRA FUNDO E DÁ UM GOLE EM SUA TAÇA DE VINHO. GABRIELA IRRITADA
CONTINUA COMENDO.
CORTA PARA:
CENA 11. FAZENDA DE ÂNGELO. QUARTO DE SOPHIA.
INTERIOR. NOITE.
ÂNGELO ENTRA NO
QUARTO DEVAGAR. SOPHIA ESTÁ DEITADA E ÂNGELO SENTA-SE AO LADO DA NETA. ALISA
SEUS CABELOS, FAZENDO-LHE CARINHO.
ÂNGELO - Dormindo?
SOPHIA VIRA-SE
PARA O AVÔ. PERCEBEMOS UMA EXPRESSÃO TRISTE NO ROSTO DA MENINA.
ÂNGELO - Por que está com esta carinha
triste? Por que não foi jantar comigo?
SOPHIA - A mamãe...
ÂNGELO - Eu sabia que tinha alguma coisa
a ver com sua mãe... O que ela fez?
SOPHIA - (CONFESSA) Disse que o Miguel
é um interesseiro, um ladrão e que ele pode me furtar algo de valor.
ÂNGELO - A sua mãe não podia ter dito
isso. O Miguel é apenas uma criança e recebe uma boa educação dos pais. Ele é
um menino de ouro.
SOPHIA - Ela me disse um monte de
coisas sobre ele.
ÂNGELO - Não dê importância! Quando sua
mãe falar mal dele, faça de conta que você está em outro lugar e pense no
Miguel como o menino especial que você conhece.
SOPHIA - (SOLTA UM LEVE SORRISO)
Obrigada, vovô!
ÂNGELO - (SORRI. BALANÇA A CABEÇA
NEGATIVAMENTE) A sua mãe só não nasceu com a língua repartida ao meio porque
seria algo muito espantoso.
SOPHIA - (SEM ENTENDER O QUE SEU AVÔ
QUIS DIZER) O que o senhor disse vovô?
ÂNGELO - (MUDA DE ASSUNTO) Nada, minha
neta, nada! Agora vamos jantar? Estou morrendo de fome, você não está?
SOPHIA - Sim.
ÂNGELO - Então vamos!
ÂNGELO PEGA A MÃO
DE SOPHIA E A LEVA PARA O JANTAR.
CORTA PARA:
CENA 12.CAMPO BONITO. FAZENDA DE ÂNGELO.
STOCK-SHOTS. EXTERNA. AMANHECER.
SUCESSÃO DE
IMAGENS DE CAMPO BONITO MOSTRANDO PASSAGEM DE TEMPO. VEMOS O MOVIMENTO NA
FAZENDA DE ÂNGELO. O GALO JÁ CANTAVA E DA COZINHA PODIA-SE SENTIR O CHEIRO
GOSTOSO DO CAFÉ DE CAROLINA.
CORTA PARA:
CENA 13. FAZENDA DE ÂNGELO. CASA GRANDE. QUARTO DE
GABRIELA E MARCELO. INTERNA.DIA.
O GALO CONTINUAVA
CANTANDO E OS PRIMEIROS RAIOS DE SOL TOMAVAM CONTA DO QUARTO DE MARCELO E
GABRIELA. GABRIELA POR SUA VEZ AINDA DORMIA, MAS DEVIDO AO CANTAR DO GALO,
PARECIA INCOMODADA. GABRIELA ACORDA-SE IRRITADA. SENTA-SE.
GABRIELA - (IRRITADA AINDA COM CARA DE SONO) Eu
vou esganar cada um desses galos insuportáveis.
GABRIELA
LEVANTA-SE. CAMINHA EM DIREÇÃO AO BANHEIRO.
CORTA PARA:
CENA 14. FAZENDA DE ÂNGELO.
CASA GRANDE. ANTE-SALA. INTERIOR. DIA.
GABRIELA VEM
DESCENDO AS ESCADARIAS. DISTRAÍDO, MIGUEL ENTRA NO CASARÃO. GABRIELA AO VÊ-LO,
PARA EM SUA FRENTE E FICA O FITANDO DE BRAÇOS CRUZADOS. O OLHA COM
SUPERIORIDADE. MIGUEL DEPARA-SE COM A MULHER.
GABRIELA - Andando pela casa a essa hora,
garoto?
MIGUEL - Eu me acordo cedo... Vim ver a
Sophia.
GABRIELA - Ela ainda está dormindo... Volte
para fora!
MIGUEL NÃO FALA
NADA, APENAS OLHA PARA GABRIELA. MIGUEL OBEDECE AS ORDENS DE GABRIELA E SAI.
GABRIELA - Moleque!
CORTA PARA:
CENA 15. FAZENDA DE ÂNGELO. CASA GRANDE. SALA DE
JANTAR. INTERIOR. DIA.
CAROLINA PREPARA A
MESA PARA O CAFÉ E NÃO PERCEBE QUANDO GABRIELA A OBSERVA. ELA LEVANTA O OLHAR E
A CUMPRIMENTA.
CAROLINA - Dona Gabriela? Bom dia! (MULHER
CONTINUOU OLHANDO A CRIADA E NÃO RESPONDEU AO “BOM DIA”) O café já está
servido. Se quiser mais alguma coisa, é só me chamar. Com licença?
GABRIELA - (IMPEDE CAROLINA DE PASSAR) Espere!
CAROLINA - (VIRA-SE) Sim?
GABRIELA - (SERIAMENTE) Como é que o filho dos
empregados circula pela casa do patrão a qualquer hora? A qualquer momento, de
livre e espontânea vontade?
CAROLINA - O Seu Ângelo gosta muito do Miguel.
Ele não se importa que o meu filho entre aqui, no casarão.
GABRIELA - Se eu fosse dona dessa fazenda, não
permitiria que aquele menino entrasse aqui a qualquer momento.
CAROLINA - (SÉRIA) Aquele menino, é meu filho!
GABRIELA - (MAIS SÉRIA AINDA) O que só aumenta
a insignificância dele!
CAROLINA FAZ
MENÇÃO DE RESPONDER, MAS A MEGERA A INTERROMPE.
GABRIELA - Nem adianta tentar me responder. Eu
sou a esposa do filho do dono dessa fazenda, não se esqueça disso. Agora me
sirva porque eu estou com fome e preciso tomar um café. Ah, e tem mais: espero
que esse seu café seja bom, porque senão eu mando você fazer outro.
GABRIELA SE SENTA À MESA
E CAROLINA, QUE ESTÁ COM OS OLHOS MAREJADOS APÓS A HUMILHAÇÃO, A SERVE.
CORTA PARA:
CENA
16. FAZENDA DE ÂNGELO. CASA GRANDE. VARANDA. EXTERNA. DIA.
MARCELO ALCANÇA UM PAR DE
BOTAS E PEGA UMA ENXADA. ÂNGELO APARECE NA VARANDA JÁ PRONTO.
ÂNGELO - Já faz um bom tempo que você não
pega numa enxada.
MARCELO - É por isso que eu vou com o senhor
para a lavoura.
ÂNGELO - (SORRI) Só quero ver...
OS DOIS CAMINHAM RUMO À
LAVOURA. CONVERSAM ALGO INAUDÍVEL.
CORTA PARA:
CENA
17. FAZENDA DE ÂNGELO. CAMPO. EXTERIOR. DIA.
SOPHIA CAMINHA POR UM
CAMPO ABERTO AO ENCONTRO DE MIGUEL. MIGUEL ESCONDE ALGO ATRÁS DELE.
SOPHIA - Você disse que iria me
acordar...
MIGUEL - Eu fui, mas...
SOPHIA - Mas, o quê?
MIGUEL - (DISFARÇA) Nada.
SOPHIA - O que está escondendo aí
atrás?
MIGUEL - É um presente pra você.
SOPHIA - Presente?
MIGUEL - Sim. Não é um desses chiques
que você ganha, mas é algo que tem grande importância.
SOPHIA - Me dê logo.
MIGUEL DÁ UM PAPEL
DOBRADO PARA A MENINA QUE ACHA ESTRANHO.
SOPHIA - O que é isso?
MIGUEL - Abra.
SOPHIA DESDOBRA O PAPEL E FICA ENCANTADA AO VER O
DESENHO. O DESENHO É O ROSTO DE SOPHIA REFLETIDO NO CÉU.
MIGUEL - (CURIOSO) O que você achou?
SOPHIA - É simplesmente lindo! Foi você
quem fez?
MIGUEL - É claro, Sophia. É o seu rosto
refletido no céu. Ali está a lua e as estrelas.
SOPHIA - (SORRINDO) É muito lindo,
Miguel.
MIGUEL - (TAMBÉM SORRI) Que bom que você
gostou... Eu fico muito feliz.
SOPHIA - Você desenha muito bem... É um
menino talentoso.
MIGUEL - Você acha?
SOPHIA - (OLHA PARA MIGUEL) Acho.
O MENINO SORRIR NOVAMENTE E FICA ADMIRANDO O
ENCANTAMENTO DE SOPHIA POR AQUELE DESENHO QUE ELE MESMO FIZERA.
CORTA PARA:
CENA 18.
FAZENDA DE ÂNGELO. QUARTO DE MARCELO E GABRIELA. INTERIOR.DIA.
GABRIELA PEGA UM SAQUINHO
DE VELUDO, DESENROLA A FITA VERMELHA QUE O FECHAVA E TIRA UM LINDO COLAR DE
PÉROLAS.
GABRIELA - (OLHA FIXAMENTE PARA O COLAR) O
colar que comprei em Paris... (FICA ADMIRANDO A JOIA) Vai me servir pra colocar
meu plano em ação!
CONTINUA OLHANDO
FIXAMENTE PARA O COLAR E SORRI MALICIOSAMENTE. IMAGEM CONGELA NO ROSTO DE
GABRIELA.
CORTA PARA:
FIM
DO CAPÍTULO 1
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